Enxaimeloso
Em certa altura da crônica de ontem, escrevi algo em torno de um certo “pseudogermanismo que nos empurram goela abaixo”. Leitores me perguntaram o que quis dizer com “pseudogermanimo” e, mais importante, quem é que nos entope a garganta com esse negócio. Calma que me explico.
Na segunda metade dos anos 1970 – e aqui me baseio nas palavras do historiador Ricardo Machado – o poder público e as elites financeiras do município começaram a trabalhar mais conscientemente na construção de uma identidade local, tendência que na época era seguida por várias cidades e regiões do país. Não de todo má, a ideia era contrapor um jeito blumenauense de ser aos hábitos e costumes do resto do país.
Lógico que esse jeito blumenauense estaria ligado às origens germânicas de Blumenau, num movimento de autoafirmação que pretendia recuperar as tradições parcialmente quebradas ou corrompidas com a Campanha de Nacionalização dos anos 1930, que fechara jornais publicados em alemão e proibira o uso do idioma em locais públicos. Esse primeiro passo rumo à valorização das raízes germânicas me parece mais do que legítimo.
O problema é que a coisa rapidamente se transformou em caricatura, processo que se acentuou nos anos 1980 com a recriação de uma Oktoberfest feita para inglês ver. No mesmo período, surgiram as leis de isenção fiscal para os prédios de arquitetura europeia, o que gerou o símbolo máximo do pseudogermanismo, o falso enxaimel ou, como preferem alguns, o “enxaimeloso”. Somos falsos alemães, não apenas nas paredes, e celebramos isso, mas até aí nada temos de prejudicial.
Tudo muda, porém, quando esse conceito de pseudogermanismo se transforma em ideologia. Seja qual for a denominação partidária, os governantes se veem na obrigação de manter a fachada de limpeza, ordem e progresso, nem que para isso precisem varrer a “sujeira” para debaixo do tapete. Pior: por parte das autoridades e até mesmo da população que se encaixaria no modelo do alemãozinho trabalhador, há flagrante DISCRIMINAÇÃO – a afirmação é grave – das etnias e das manifestações culturais que fogem ao estereótipo. O recente descaso com o carnaval de rua de Blumenau é um exemplo do que digo.
Podem crer: não somos apenas esse desenho com suspensórios e pena no chapéu. Mas, em vez de consolar, a constatação gera uma pergunta incômoda: quem realmente somos?
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