quarta-feira, 19 de maio de 2010

Patrimônio em movimento no Santa por Wania Bittencourt

19/05/2010 | N° 11942

CULTURA

Caminhos do tempo

PROJETO PATRIMÔNIO EM MOVIMENTO MOSTRA TRANSFORMAÇÃO DAS RUAS DE BLUMENAU EM ROTEIROS GUIADOS

A história de Blumenau passa pelos olhos de seus moradores e visitantes em uma média de 60km/h. É através do vidro dos carros que adultos, jovens e crianças enxergam prédios novos, antigos, carros, bicicletas, pedestres. Como o acelerador é mais rápido que a percepção, poucos param para compreender o que visualizam. Mas é este olhar mais atento que os historiadores Ricardo Machado e Darlan Jevaer Schmitt pretendem aguçar na população através do projeto Patrimônio em Movimento. Durante três finais de semana, eles guiam os participantes pelas principais ruas da cidade e lançam um olhar crítico sobre a história em constante transformação.

O projeto esteve nas ruas São Paulo, 7 de Setembro, São José e João Pessoa e, no próximo final de semana, circulará na Rua XV de Novembro e arredores. Antes disso, Patrimônio em Movimento ofertou oficinas de formação e, em junho, pretende montar uma exposição de fotos produzidas pelos próprios participantes, na tentativa de compreender os elementos que compõem o cenário urbano, como ruas, casas, monumentos e, claro, as pessoas.

– Elas poderão avaliar e refletir sobre esses elementos e compreender o que ganhamos e o que perdemos com a transformação desses espaços. Compreender o que fizemos com nós mesmos e com a sociedade – explicar Machado.

Entre as transformações que afetaram a relação com o patrimônio está o uso do automóvel no lugar de outras formas de locomoção. Como efeito colateral, casas residenciais que antes eram construídas próximas à via, agora, afetadas pelo barulho, precisaram ser reinventadas, transformando-se em espaços comerciais. Da mesma forma, a relação entre comunidade e rua se alterou em busca de segurança e privacidade. As janelas estão em sua maioria fechadas e quase não se vê ninguém nas sacadas de casas antigas. A maioria dos locais de socialização são fechados e a rua perdeu o seu caráter de espaço para troca de ideias.

Outras mudanças também podem ser notadas. Na Rua São Paulo, por exemplo, com o encerramento dos trabalhos da oficina da estação ferroviária e do porto, o espaço precisou rever a função de fluxo comercial para servir de ligação entre o Sul e Norte da cidade. A 7 de Setembro ganhou mais visibilidade após a construção do shopping na década de 1990. E a Rua João Pessoa mantém seu caráter residencial. Detalhes como estes podem ser conferidos pelo público que participar da caminhada (confira roteiro na página 2).

Tombamento

Quando se fala de história, compreender a função de prédios antigos – alguns deles tombados – é essencial, mesmo que a questão não seja o foco central do projeto. De acordo com Schmitt, o Patrimônio em Movimento não possui uma visão saudosista. Tem a intenção de refletir sobre o uso dos espaços:

– Não adianta tombar se não tiver reconhecimento público do que ele representa.

Segundo os historiadores, a escolha do que será preservado passa por uma decisão política. E, de acordo com o projeto, “lembrar e preservar significa também esquecer e destruir”. Ou seja, há uma escolha sobre o que será lembrado. Um exemplo é a política de tombamento que favorece a preservação do que está no Centro para, depois, avaliar os bairros. Em função disso, a Rua XV de Novembro é a que possui mais prédios preservados pelo patrimônio histórico, um total de 36.

wania@santa.com.br

WANIA BITTENCOURT



19/05/2010 | N° 11942

CULTURA

CULTURA

CONFIRA AS PRINCIPAIS RUAS APRESENTADAS NO ROTEIRO DE CAMINHADAS DO PROJETO PATRIMÔNIO EM MOVIMENTO




Rua XV de Novembro

Localizada próxima ao antigo porto, sempre foi a principal via de ligação da cidade, especialmente na época em que não havia a Beira-Rio e a Rua 7 de Setembro era limitada. Em função disso, no espaço foram levantadas imponentes construções que, no entanto, passaram por processo de modernização após a Segunda Guerra Mundial. Apesar disso, por se localizar no coração da cidade, é a rua que possui mais prédios tombados, em níveis nacional, estadual e municipal. A maioria é datado do começo e meados do séculos passado. Curioso é reconhecer que encantantamenro dos turistas não se dá por meio dos prédios protegidos pelo patrimônio histórico, mas através das construções da década de 1970 e 1980 que, na verdade, imitam a técnica do enxaimel, trazida pelos colonizadores, na tentativa de reinstalar o caráter germânico à cidade. Fotos antigas da Rua XV e da região do Biergarten também mostram que as pessoas costumavam aproveitar o espaço público como lazer, algo que pouco ocorre atualmente.

Rua São Paulo

Sede de um antigo porto do Rio Itajaí-Açu e da antiga oficina da Estrada de Ferro Santa Catarina, a Rua São Paulo sempre foi um espaço de grande circulação de pessoas e tinha hotéis e casas comerciais. No entanto, com o fechamento do porto e o fim a estrada de ferro, a rua precisou se reinventar e se transformou em uma das principais vias de acesso automobilístico para a região norte da cidade e à BR-470. A mudança na forma de usar a via interfere na relação entre comunidade e patrimônio. Prédios construídos na beira da estrada, por exemplo, ganham um outro olhar e uma diferente valorização imobiliária, tornando-se comerciais ou, como na foto, esquecidos no tempo.

Rua Amadeu da Luz e Rua São José

A Rua São José foi durante muito tempo um prolongamento da João Pessoa e, assim como a via principal, servia de ligação entre o Bairro da Velha com a região central de Blumenau. A Amadeu da Luz, por sua vez, ainda possui casas bastante antigas, datadas de 1911 e 1927, o que demonstra que o espaço era usado para habitação, integrando-se à vida cotidiana da cidade.

Rua João Pessoa

Peculiar, a Rua João Pessoa, desde seus primórdios, possui um caráter residencial, que se mantém até os dias de hoje. A forma de construção dos prédios, com dois andares, indica a existência inicial de famílias que viviam do comércio. Em geral, elas moravam na parte superior da casa e mantinham algum comércio na parte inferior. Seu caráter residencial é mantido por ser a principal conexão entre o Centro (Rua 7 de Setembro) e o Bairro da Velha, essencialmente residencial. De acordo com os historiadores, até hoje o espaço conserva um conjunto de casas antigas, que apresentam elementos arquitetônicos importantes para Blumenau.

Rua 7 de Setembro

Três momentos importantes marcaram as transformações na Rua Sete de Setembro. Nos primeiros anos, a via servia de acesso aos depósitos das casas de comércio da Rua XV de Novembro e raros eram os casarões residenciais – alguns, inclusive, ainda existem. Foi somente na década de 1950, após a construção da rodoviária na região central, que o espaço ganhou mais movimentação popular. Por fim, na década de 1990, com a construção do shopping, a rua se valoriza ainda mais, marcando outro traço da sociedade, que é a reunião para trocar ideias em espaços fechados e não mais na rua.





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